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Rebalanceamento Oportunista: o único almoço grátis do mercado

É consenso que o rebalanceamento esporádico é uma excelente forma de gerenciar risco de um portfólio com classes de ativos distintas.

Mas qual é a melhor forma de fazê-lo?

E será que o rebalanceamento também pode ser usado para “gerar alfa” (retorno acima do esperado)?

Foram essas perguntas que Gobind Darynani buscou responder no seu artigo publicado em 2008 chamado “Opportunistic Rebalancing: A New Paradigm for Wealth Managers“.

Gobind Daryanani é CFP®, Ph.D , Diretor na TD Ameritrade e pesquisador na área de rebalanceamento. Na boa, vamos ouvir o que o cara tem pra dizer?

A maioria dos gestores tradicionalmente rebalanceiam seus portfólios anual, semestral ou trimestralmente (faça chuva ou faça sol). Daryanani (2008), entretanto, sugere uma estratégia de rebalanceamento que vai muito alé do gerenciamento de risco. Sua estratégia apresenta uma melhora significativa no retorno de longo prazo ao capturar com mais eficiência as oportunidades de “compra na baixa” e “venda na alta”, ao mesmo tempo que evita o efeito “sabonete”* (custos operacionais, impostos e spread):

o “Rebalanceamento Oportunista“.

Ao verificar a alocação percentual do portfólio com mais frequência, mas rebalancear somente quando necessário, o benefício médio do rebalanceamento supera em praticamente o dobro do benefício do rebalanceamento por calendário (anual, semestral ou trimestral).

“Mas IFP, um holder raiz não deveria simplesmente comprar e buscar sua alocação percentual desejada apenas com novos aportes?”

No Way Reaction GIF by MOODMAN

No começo os seus aportes provavelmente serão suficientes para manter sua alocação percentual desejada. Mas depois de alguns anos, se você quiser manter sua alocação percentual desejada, vai ter que rebalancear fazendo trades mesmo…

Segundo Goodsall (1994, apud Daryanani, 2008), o rebalanceamento é uma forma de explorar ruídos de curto prazo e a tendência que o mercado tem de exagerar no otimismo e pessimismo com frequência.

E Daryanani (2008) demonstra que um portfólio que não é rebalanceado nunca, tende a apresentar um aumento do risco ou diminuição do retorno no longo prazo (ou ambos).

Portanto, a questão para o autor não é “se” deveríamos rebalancear, mas “como” fazê-lo**.

Na figura abaixo ele apresenta quatro estratégias de rebalanceamento diferentes.

Spoiler: a última é a estratégia que apresenta o maior benefício no longo prazo.

  1. Rebalanceamento por calendário: todas as classes de ativos são rebalanceadas para o benchmark percentual do portfólio em datas pré-definidas (amarelo);
  2. Rebalanceamento de faixa para faixa percentual: classes de ativos são rebalanceadas somente se pelo menos uma classe sair da faixa de variação percentual pré-definida. Classes fora da faixa são trazidas para a borda da faixa (verde);
  3. Rebalanceamento de faixa para benchmark de portfólio: classes de ativos são rebalanceadas somente se pelo menos uma classe sair da faixa de variação percentual pré-definida. Todas as classes são trazidas para o benchmark percentual do portfólio (azul);
  4. Rebalanceamento de faixa para faixa percentual de tolerância: classes de ativos são rebalanceadas somente se pelo menos uma classe sair da faixa de variação percentual pré-definida. Classes fora da faixa são trazidas para dentro da faixa percentual de tolerância (vermelho);

Mas qual é a vantagem de definir uma faixa de variação percentual (como gatilho) e uma faixa de tolerância (como alvo)?

O rebalanceamento por calendário (estratégia 1) tem um gatilho descorrelacionado à volatilidade dos ativos (acaba perdendo algumas oportunidades de curto prazo como, por exemplo, março de 2020). Já o rebalanceamento apenas para a borda da faixa percentual (estratégia 2) acaba não aproveitando todo o potencial das assimetrias temporárias. Entretanto, o rebalanceamento para o benchmark (estratégia 3) implica necessariamente em uma correção de todas as classes de ativos (ou seja, mais custos operacionais, impostos e spread)

O autor demostra que ao trabalhar com uma faixa percentual (como gatilho para o rebalanceamento) e com uma faixa percentual de tolerância (como alvo do rebalanceamento), você otimiza o retorno, ao mesmo tempo que reduz os custos. Ou seja, quanto menos trades você precisar fazer, menores serão os custos do rebalanceamento (e essa estratégia geralmente implica em apenas uma compra e uma venda por rebalanceamento).

Mas vamos às peculiaridades do estudo.

Classes de ativos:

Os percentuais considerados nas simulações em Daryanani (2008) foram 60% renda variável e 40% renda fixa.

As classes de ativos utilizadas foram:

  • 25% Large Caps EUA (S&P 500);
  • 20% Small Caps EUA (Russel 2000);
  • 10% Mercado Imobiliário (Dow Jones REIT);
  • 5% Commodities (Dow Jones AIG);
  • 40% Renda Fixa (Bloomberg 7-10 anos).

Período:

O período utilizado foi de janeiro de 1992 a dezembro de 2004.

A escolha por começar apenas em janeiro de 1992 se deu pela inconsistência da disponibilidade de preços diários para cada classe de ativo antes de 1992.

Faixas de rebalanceamento e faixas de tolerância:

As faixas de rebalanceamento representam uma porcentagem da alocação percentual de cada ativo (para mais ou para menos). Já as faixas de tolerância adotadas no estudo representam 50% da faixa de rebalanceamento.

Por exemplo, para o ativo “Small Caps EUA” com alocação percentual de 20%, com uma faixa de rebalanceamento de 10% (para mais ou para menos) e faixa de tolerância de 5%, teríamos:

Faixa de rebalanceamento entre 18% e 22% e faixa de tolerância entre 19% e 21%. Ou seja, o rebalanceamento seria apenas necessário se a alocação percentual do ativo em questão saísse da faixa de 18%-22%. Quando necessário, o rebalanceamento traria a alocação percentual para dentro da faixa de tolerância de 19%-21%. Portanto, na estratégia proposta pelo autor não é necessário trazer a alocação percentual para o alvo exato de 20%.

O estudo simulou faixas de rebalanceamento de 0%, 5%, 10%, 15%, 20%, 25% e 100%.

Uma faixa de variação percentual de 0% equivale a rebalancear toda vez que o investidor verifica o portfólio, independente da alocação percentual atual (ou seja, rebalanceamento por calendário). Já a faixa de rebalanceamento de 100% equivale a nunca rebalancear o portfólio.

Intervalos:

O estudo simulou intervalos de verificação da alocação percentual do portfólio de 1, 5, 10, 20, 60, 125 e 250 dias de negociação.

Como apenas os dias de efetiva negociação foram considerados, os intervalos equivalem a aproximadamente verificações diárias (1), semanais (5), quinzenais (10), mensais (20), trimestrais (60), semestrais (125) e anuais (250).

O retorno anual médio do portfólio que não foi rebalanceado ficou em 9,186%.

Partindo desse retorno referencial o autor verificou os benefícios de cada modalidade de rebalanceamento explorada.

No rebalanceamento por calendário, podemos verificar um leve benefício para o rebalanceamento mensal, trimestral, semestral e anual. Já os rebalanceamentos diários, semanais e quinzenais apresentaram uma redução no retorno. Ou seja, os custos dos trades frequentes (custo operacional, imposto e spread, por exemplo) superaram um possível benefício do rebalanceamento (efeito “sabonete”).

Podemos verificar que conforme a faixa de rebalanceamento aumenta, os benefícios do rebalanceamento aumentam até a faixa de 20%. Entretanto, quando aumentamos a faixa de rebalanceamento para 25%, verificamos uma redução no benefício do rebalanceamento. Isso acontece porque com faixas maiores acabamos perdendo várias oportunidades de “compra na baixa” e “venda na alta”.

A faixa de rebalanceamento que apresentou o maior benefício foi a de 20% para verificações diárias, semanais e quinzenais (linha amarela acima). Ou seja, verificar a alocação percentual do portfólio diariamente, semanalmente ou quinzenalmente e somente rebalancear quando pelo menos uma classe de ativo extrapolar a faixa de 20% (para mais ou para menos) da porcentagem previamente definida foi a modalidade que trouxe os maiores benefícios.

Por fim, vale ressaltar que a verificação diária, semanal e quinzenal com faixas de rebalanceamento de 20% apresentaram aproximadamente o dobro do benefício do rebalanceamento por calendário anual e semestral.

Ninguém sabe o que vai acontecer daqui a um dia, semana, mês ou ano. O que sabemos é que esporadicamente o mercado cria assimetrias significativas e temporárias que tendem a ser corrigidas através de um movimento natural de reversão.

O rebalanceamento oportunista não requere que nós saibamos “quando” esses movimentos vão ocorrer. Ele apenas se baseia no fato de que esses movimentos simplesmente ocorrem. E, como demonstrou o estudo, se olharmos a alocação percentual do nosso portfólio com frequência e definirmos uma faixa de rebalanceamento adequada, tendemos a automaticamente capturar e nos beneficiar desses movimentos naturais.

A faixa de rebalanceamento de 20% com verificações diárias, semanais e quinzenais demonstrou ser o equilíbrio perfeito entre “aproveitar as assimetrias temporárias ao máximo” “sem precisar fazer muito trades” (reduzindo custos)

Depois desse estudo, confesso que revisei a estratégia de rebalanceamento da minha “Política de Investimentos Pessoal“.

E você?

Qual estratégia de rebalanceamento você tem adotado?


* Dizem que patrimônio é igual sabonete: quanto mais troca de mão, menor fica.

**Só lembrando que nesse artigo falamos apenas de rebalanceamento entre classes de ativos distintas. Não vou me adentrar no rebalanceamento entre ações individuais, por exemplo, porque já abordei o problema do “cultivo de ervas daninhas” e o efeito “buraco negro” em outro artigo.

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8 comentários em “Rebalanceamento Oportunista: o único almoço grátis do mercado”

  1. Excelente post. Muita pesquisa e ótimo conteúdo.
    Fazia também rebalanceamento com aportes apenas mas já não está dando mais. Faço trimestralmente agora.
    Com sua licença, gostaria de convidar seus leitores para Participar da Pesquisa FIRE 2021. Clique em [https://aposenteaos40.org/2021/08/anuario-fire-2021-esperamos-a-sua-resposta.html] e responda ao questionário. Quem puder divulgar, por favor ajude. Abcs AA40

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